Jesus Crucified

Jesus Crucified
Jesus Christ have mercy on us

Holy Tridentine Mass - Santa Missa Tridentina.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

MEMÓRIAS DA IRMÃ LÚCIA-SEGUNDA MEMÓRIA-Lúcia vai à escola

MEMÓRIAS DA IRMÃ LÚCIA-SEGUNDA MEMÓRIA
III. DEPOIS DAS APARIÇÕES
1. Lúcia vai à escola

Que coisa, estou a escrever para aqui, sem rei nem roque,
como se costuma dizer; e já vou deixando para trás algumas coisas.
Mas estou fazendo como V. Ex.cia Rev.ma me disse: que escrevesse à maneira que me fosse recordando, com toda a simplicidade.
Assim, pois, o quero fazer, sem me importar de ordem nem estilo.
Parece-me que, assim, a minha obediência é mais perfeita e,
portanto, mais agradável a Nosso Senhor e ao Imaculado Coração
de Maria.
Volto, pois, à casa paterna. Já disse a V. Ex.cia que minha mãe
teve de vender o nosso rebanho, ficando apenas com umas três
ovelhas que levávamos atrás de nós para os campos, e, quando
não íamos, dávamos-lhes alguma coisa de comer, no curral. Minha
mãe mandou-me, então, à escola; e, no tempo que me ficava
livre, queria que aprendesse a tecer e a costurar. Assim, tinha-me
segura em casa e não tinha que perder tempo à minha procura.
Um belo dia falaram a minhas irmãs para irem, com outras
raparigas, fazer as vindimas dum rico Senhor de Pé de Cão.
Minha mãe resolveu que elas iriam, mas que eu ia também com
elas. (Também já disse, no princípio, que minha mãe tinha o costume de não as deixar ir a parte alguma sem me levarem).

2. Atitude do Pároco
Por esta ocasião, o Senhor Prior começou também a preparar
as crianças para uma comunhão solene. Como desde os 6 anos
que eu repetia a comunhão solene, minha mãe resolveu que este
ano não a faria. Por este motivo, não fui à explicação da doutrina.
Ao sair da escola, enquanto as demais crianças iam para a varanda
do Senhor Prior, eu vinha para casa continuar a minha costura
ou a teia. O bom Pároco levou a mal a minha falta à doutrina e sua
irmã, um dia, ao sair da escola, mandou-me chamar por uma outra
criança. Esta encontrou-me já a caminho de Aljustrel, junto da casita dum pobre homem a quem chamavam o Caracol. Disse-me que a irmã do Senhor Prior me mandava chamar, por isso, que fosse lá.
Julgando que era para algum interrogatório, desculpei-me, dizendo
que minha mãe me tinha mandado ir em seguida para casa; e,
sem mais, deitei a correr como uma tonta, pelos campos fora, em
busca dum esconderijo onde não pudesse ser encontrada. Mas,
desta vez, a brincadeira saiu-me cara.
Passados poucos dias, houve na Freguesia uma festa, cuja
Missa vieram a cantar vários Sacerdotes de fora. Ao terminar a
festa, o Senhor Prior mandou-me chamar e, diante de todos aqueles
Sacerdotes, repreendeu-me severamente por não ter ido à doutrina,
por não ter acudido ao chamamento de sua irmã, enfim, todas as
minhas misérias ali apareceram; e o sermão foi-se prolongando
por largo tempo. Por fim, não sei como, apareceu ali um venerável
Sacerdote que procurou advogar a minha causa. Quis desculpar--me, dizendo que talvez fosse a minha mãe que me não deixava.
Mas o bom Pároco respondeu:
– A mãe? A mãe é uma santa! Ela é que é uma criatura que
ainda estamos para ver o que daqui vai sair!

O bom Sacerdote, que vinha a ser o Senhor Vigário de Torres
Novas, perguntou-me, então, amavelmente, o motivo por que não
tinha ido à doutrina. Expus, então, a determinação que minha mãe
tinha tomado. Parecendo não acreditar, o Senhor Prior mandou--me chamar a minha irmã Glória, que ali estava no adro, para se
informar da verdade. Depois de saber que as coisas eram como
eu acabava de dizer, concluiu:
– Pois bem: ou a menina agora há-de vir, estes dias que faltam,
à doutrina e, depois de fazer a confissão comigo, receber a
comunhão solene com as demais crianças ou, então, na Freguesia,
não torna a receber a comunhão.

Ao ouvir tal proposta, minha irmã apresentou que, 5 dias antes,
eu devia partir com elas e que nos fazia muito desarranjo; que, se
Sua Rev.cia queria, que eu me ia confessar e comungar em outro
dia, antes de partir. O bom Pároco não atendeu a pedidos e manteve
firme a sua proposta.
Ao chegar a casa, informámos minha mãe que ainda foi
também pedir a Sua Rev.cia para me confessar e dar a Sagrada
Comunhão em outro dia. Mas tudo foi inútil. Minha mãe decidiu,
então, que, além de ser longíssimo, era preciso ir por caminhos
péssimos, atravessar montes e serras, que, depois do dia da
comunhão solene, meu irmão faria a viagem para me lá ir levar. Eu
creio que suava tinta só com a ideia de ter de me confessar com o
Senhor Prior! Que medo que eu Ihe tinha! Chorava de aflição.
Chegou a véspera e Sua Rev.cia mandou que todas as crianças, à
tarde, fossem à Igreja, para se confessarem. Lá fui, pois, com o
coração mais apertado do que se estivesse em uma prensa.
Ao entrar na Igreja, vi que havia vários Sacerdotes confessando. Em um confessionário, ao fundo, estava o Senhor Padre Cruz, de Lisboa. Eu já tinha falado com Sua Rev.cia, de quem tinha gostado muito. Sem reparar que em confessionário aberto, a meio da Igreja, estava o Senhor Prior notando tudo, pensei: Primeiro, vou confessar-me ao Senhor Padre Cruz e perguntar-lhe como
hei-de fazer; e depois vou, então, ao Senhor Prior.
O Senhor Dr. Cruz recebeu-me com toda a amabilidade e,
depois de me ouvir, deu-me os seus conselhos, dizendo que, se
não queria ir junto do Senhor Prior, que não fosse; e que, por isso,
Sua Rev.cia não me poderia negar a comunhão. Radiante com tais
conselhos, rezei a penitência e escapei-me da Igreja, com medo
que alguém me chamasse. No dia seguinte, lá fui com o meu vestido branco, receando ainda que a comunhão me fosse negada.
Mas Sua Rev.cia contentou-se, por então, com fazer-me saber, no
fim da festa, que não Ihe tinha passado desapercebida a minha
falta de obediência em ir-me confessar com outro Sacerdote.
O bom Pároco continuou a mostrar-se cada vez mais descontente e perplexo a respeito dos factos e, um belo dia, deixou a Freguesia. Espalhou-se, então, a notícia que Sua Rev.cia havia saído por minha causa por não querer assumir a responsabilidade
dos factos. Como era um Pároco zeloso e querido do povo, não me faltou, por isso, que sofrer. Algumas piedosas mulheres, quando me encontravam, desafogavam o seu desgosto, dirigindo-me insultos; e, por vezes, despediam-me com um par de bofetadas ou pontapés.