As famílias devem reagir
É o tempo apropriado de reagir. Quando Gaudium et Spes fala
do movimento da história que “se torna tão rápido que cada um tem
dificuldade de o seguir”, pode-se entender este movimento como uma
precipitação das sociedades liberais na desagregação e no caos.
Acautelemo-nos de o seguir!
Como
compreender que dirigentes apelem para a religião cristã ao passo que
destroem toda a autoridade no Estado? Importa ao contrário
restabelecê-la, que foi querida pela Providência nas sociedades naturais
de direito divino cuja influência neste mundo é primordial: a família e
a sociedade civil. É a família que recebeu nestes últimos tempos os
mais rudes golpes; a passagem para o socialismo em países como a França e
a Espanha não fez senão acelerar o processo.
As
leis e medidas que se sucederam mostram uma grande coesão na vontade de
arruinar a instituição familiar: diminuição da autoridade paterna,
divórcio facilitado, desaparecimento da responsabilidade no ato da
procriação, reconhecimento administrativo dos casais irregulares e mesmo
de duplas homossexuais, coabitação juvenil, casamento de experiência,
diminuição das ajudas sociais e fiscais às famílias numerosas... O mesmo
Estado, em seus interesses próprios, começa a perceber as conseqüências
disto no que toca à diminuição da natalidade, ele se pergunta como, num
tempo próximo, as jovens gerações poderão assegurar os regimes de
retração daquelas que deixaram de ser economicamente ativas. Mas os
efeitos são consideravelmente mais graves no domínio espiritual.
Os
católicos não devem seguir mas ponderar com todo o seu peso, uma vez
que são também cidadãos, para endireitar tudo o que for preciso. É por
isso que eles não poderiam ficar à margem da política. Portanto seu
esforço será sobretudo sensível na educação que proporcionam a seus
filhos.
Sobre
este assunto, a autoridade é contestada nas suas próprias fontes por
aqueles que declaram que “os pais não são os proprietários dos filhos”,
querendo dizer com isto que a educação destes cabe ao Estado, com suas
escolas leigas, suas creches, suas maternais. Censuram-se os pais de não
respeitar a “liberdade de consciência” de seus filhos quando os educam
segundo suas próprias convicções religiosas.
Estas
idéias remontam aos filósofos ingleses do século XVII que não queriam
ver nos homens senão indivíduos isolados, independentes de nascimento,
iguais entre si, subtraídos a toda autoridade. Nós sabemos que isto é
falso. A criança recebe tudo de seu pai e de sua mãe, alimento corporal,
intelectual, educação moral, social. Eles se fazem ajudar por
professores que partilharão, no espírito dos jovens, a sua autoridade
mas, seja por meio de uns ou por meio de outros, a quase totalidade da
ciência adquirida no decurso da adolescência pessoal será mais uma
ciência apreendida, recebida, aceita, do que uma ciência deduzida da
observação e da experiência pessoal. Os conhecimentos vêm por uma parte
considerável da autoridade que transmite. O jovem estudante acredita em
seus pais, em seus professores, em seus livros e assim seu saber se
estende.
Isto
é ainda mais verdadeiro com os conhecimentos religiosos, com a prática
da religião, com o exercício da moral conforme à fé, às tradições, aos
costumes. Os homens em geral vivem em função das tradições familiares,
isto se observa em toda a superfície do globo. A conversão a uma outra
religião do que aquela que se recebeu durante a sua infância encontra
sérios obstáculos.
Esta
extraordinária influência da família e do meio é querida por Deus. Ele
quis que seus benefícios se transmitissem em primeiro lugar através da
família; é por esta razão que concedeu ao pai de família uma grande
autoridade, um imenso poder sobre a sociedade familiar, sobre sua
esposa, sobre seus filhos. A criança nasce numa fraqueza tão grande que
se pode julgar da necessidade absoluta da permanência do lar, de sua
indissolubilidade.
Querer
exaltar a personalidade e a consciência da criança em detrimento da
autoridade familiar, é fazer a sua desgraça, impeli-la à revolta, ao
desprezo dos pais, enquanto que a longevidade é prometida àqueles que
honrarem os seus. São Paulo, ao relembrá-lo, estabelece também um dever
aos pais de não exasperarem os filhos, mas de educá-los na disciplina e
no temor do Senhor.
Se
fosse preciso esperar ter a inteligência da verdade religiosa para crer
e converter-se, não haveria senão bem poucos cristãos atualmente.
Crê-se nas verdades religiosas porque as testemunhas são dignas de
credibilidade por sua santidade, seu desinteresse, sua caridade. Pois,
como diz Santo Agostinho, a fé dá inteligência.
A
função dos pais tornou-se muito difícil. Nós o vimos, a maioria das
escolas livres foram laicizadas de fato, e nelas não se ensina mais a
verdadeira religião nem as ciências profanas a luz da fé. Os catecismos
difundem o modernismo. A vida trepidante é devoradora de tempo, as
necessidades profissionais distanciam pais e filhos dos avôs e avós que
participavam outrora da educação. Os católicos não estão apenas
perplexos mas desarmados.
Mas
isto absolutamente não a ponto de não poderem assegurar o essencial,
suprindo a graça de Deus o resto. O que é preciso fazer? Existem escolas
verdadeiramente católicas, se bem que em número reduzido. Enviai para
lá vossos filhos, mesmo se isto pesar no vosso orçamento. Abri novas,
como alguns já o fizeram. Se não podeis freqüentar senão escolas onde o
ensino é desnaturado, manifestai-vos, reclamai, não deixeis os
educadores fazer vossos filhos perder a fé.
Lede,
relede em família o catecismo de Trento, o mais belo, o mais perfeito e
o mais completo. Organizai “catecismos paralelos” sob a direção
espiritual de bons sacerdotes, não tenhais medo de ser tratados, como
nós, de “selvagens”. Aliás, numerosos grupos já funcionam que acolherão
vossos filhos.
Rejeitai
os livros que veiculam o veneno modernista. Fazei-vos aconselhar.
Editores corajosos difundem excelentes obras e reimprimem as que os
progressistas destruíram. Não adquirais qualquer Bíblia; toda família
cristã deveria possuir a Vulgata, tradução latina feita por são Jerônimo
no século IV e canonizada pela Igreja1.
Atende-vos à verdadeira interpretação das Escrituras, conservai a
verdadeira missa e os sacramentos tais como eram administrados por toda a
parte até bem pouco.
Atualmente
o demônio desencadeou-se contra a Igreja, pois é bem disso que se
trata: nós assistimos talvez a uma de suas últimas batalhas, uma batalha
geral. Ele ataca em todas as frentes e se Nossa Senhora de Fátima disse
que um dia ele subiria até as mais altas esferas da Igreja, é que isto
podia acontecer. Nada afirmo de mim mesmo, entretanto há sinais que
podem fazer-nos pensar que, nos mais elevados organismos romanos,
pessoas perderam a fé.
Devem-se
tomar medidas espirituais urgentes. É preciso rezar, fazer penitência,
como a Santíssima Virgem o pediu, recitar o terço em família. As
pessoas, viu-se em cada guerra, se põem a rezar quando as bombas começam
a cair. Mas precisamente, elas caem neste momento: estamos a ponto de
perder a fé. Compreendeis que isto ultrapassa em gravidade todas as
catástrofes que os homens temem, as crises econômicas mundiais ou os
conflitos atômicos?
Renovações
se impõem, mas não creiais que não possamos contar para isto com a
juventude. Não é toda a juventude que está corrompida, como se tenta
persuadir-nos. Muitos têm um ideal, a muitos outros basta propor um.
Abundam os exemplos de movimentos que fazem apelo com sucesso à
generosidade: os mosteiros fiéis à tradição os atraem, não faltam
vocações de jovens seminaristas ou de noviços que pedem formação. Há um
magnífico trabalho a realizar conforme as instruções dadas pelos
Apóstolos: Tenete traditiones... Permanete in iis quae didicistis.
O
velho mundo chamado a desaparecer é o do aborto. As famílias fiéis à
tradição são ao mesmo tempo famílias numerosas, sua própria fé lhes
assegura a posteridade. “Crescei e multiplicai-vos!” Conservando o que a
Igreja sempre ensinou, vós vos ligais ao futuro.
Dom Marcel Lefebvre
Dom Marcel Lefebvre